
Finalmente, a menopausa começa a deixar a de ser tabu. E com vontade de participar deste processo de esclarecimento e de acolhimento, duas mulheres que am pela menopausa, a dramaturga curitibana Anna Toledo e a atriz Claudia Raia, resolveram fazer acontecer a peça “Cenas da Menopausa”. O espetáculo, que conta também com Jarbas Homem de Mello no elenco, chega a Curitiba neste fim de semana (dias 6, 7 e 8) no Teatro Guaíra, auditório Bento Munhoz da Rocha Neto (Guairão). O texto explora mudanças corporais, questionamentos de vida e carreira, saúde, beleza, expectativas sociais, sexo e relacionamentos afetivos, propondo uma conversa divertida e honesta sobre esta fase transformadora que impacta não só as mulheres, mas todos à sua volta.“A menopausa não é um fim, é o segundo ato da vida da mulher – e agora um espetáculo! Subo no palco para dar voz a essa revolução, com humor, verdade e emoção. Já falamos de tantos tabus, por que não esse? No palco, sou muitas; na plateia, somos milhões – e juntas, seguimos mais livres”, afirma a atriz Claudia Raia, em entrevista ao Bem Paraná.O convite para Anna Toledo escrever o espetáculo veio de Claudia Raia. “Tanto Claudia como eu estávamos ando por este processo desestruturador chamado menopausa, e senti que era uma oportunidade maravilhosa de transformar todo aquele caos em algo de que pudéssemos rir e fazer rir”, conta Anna. “O processo é avassalador e súbito, nos pega absolutamente desprevenidas justamente quando a gente está se sentindo no auge, entre os 40 e 50 anos, e dá uma desestabilizada geral na cabeça e no corpo. Então é absolutamente normal, primeiro, não reconhecer o que está acontecendo e, quando finalmente a ficha cai, ficar revoltada com a ‘injustiça’ que é levar mais essa rasteira da vida”, acrescenta.Pensando nos altos e baixos da menopausa, Anna estruturou a peça em cenas independentes, inspirada nas fases do luto.As personagens am pela negação, revolta, depressão, até chegar na aceitação da nova realidade e no acolhimento da nova pessoa que emerge. “Somos apresentados a Teresa, cujos sintomas do climatério geram uma crise no casamento; Laurinha, que está em negação e atravessando mudanças de humor; Gilda, que vive o clichê de ter sido trocada por uma mulher mais jovem; e Isabel, uma executiva que teme perder a autoridade diante da equipe – todas interpretadas por Claudia Raia”, explica a dramaturga.Sobre a peça, Claudia Raia deu a seguinte entrevista ao ‘Bem Paraná’. 59504r
Bem Paraná — A peça aborda tema que só agora está sendo abertamente falado, a menopausa. Um assunto que afeta todas as mulheres. Por que você acha que demoramos tanto para falar abertamente sobre isso?
Claudia Raia — Comecei a falar sobre menopausa há oito anos, nas minhas redes. Defendo a mulher de 50+, encorajo as mulheres a enfrentarem esse momento, a investigarem o que está acontecendo com seus corpos. Sabemos que a menopausa é esse tabu imenso, um assunto muito neurálgico, que toca num lugar profundo das mulheres, que coloca as mulheres em um lugar de descarte na sociedade. Menopausa ainda é um grande mistério, até para os médicos. Quando chegamos a esse momento, muitas vezes não sabemos o que fazer e não temos com quem conversar. Porque fomos ensinadas a calar. A menopausa sempre foi tratada como um fim, como sinônimo de velhice, de decadência. Um tema cercado de vergonha, de silêncio. Mas é justamente o contrário: é o começo de um segundo ato na vida da mulher. A sociedade ainda tem muita dificuldade em lidar com o corpo e a potência da mulher madura. Falamos da adolescência, da gravidez, do pós-parto e silenciamos a menopausa, área que ainda é a menos estudada e financiada, e que impacta tanto a saúde física quanto mental das mulheres. E precisamos falar, sem medo, sem tabu, com acolhimento, falar de alternativas para se viver melhor como a reposição hormonal para quem pode, e com indicação médica. Então mulheres, busquem informação! Falar sobre isso me libertou demais. Não só me libertou falando na internet com as mulheres, mas neste espetáculo que foi produzido com tanto carinho, escrito pela Anna Toledo, que também vive esta experiência da menopausa. E tem sido transformador fazer este espetáculo, ouvir as mulheres todas as noites, com histórias completamente diferentes. Isso faz acontecer uma magia dentro de mim, traz muito autoconhecimento.
BP — Como você encara a sua menopausa?
Claudia Raia — Eu mesma demorei para perceber que estava na menopausa até que tudo começou a acontecer de uma vez. Entendi que estava ando por algo muito forte, tinha névoa mental, esquecimentos, calores ináveis, dores no corpo e eu achava que estava treinando demais por ser bailarina, mas era meu corpo tentando me dizer algo. Acordava às três da manhã com insônia, como se o corpo estivesse ligado. Era o ciclo circadiano, um processo hormonal natural que a gente não conhece. E mesmo com muita informação a respeito, demorei para identificar que eu estava neste período da menopausa. Foi um baque no começo, sentia uma tristeza estranha, achava que era estresse. Hoje, encaro com consciência e coragem. ei a dividir minha experiência com outras mulheres, porque a menopausa precisa deixar de ser um tabu. A menopausa me mostrou que a mulher que está nos livros de medicina não é a mulher ‘menopausada’ de hoje. A mulher de hoje vive 40 anos a mais depois da menopausa, produzindo, trabalhando, criando filhos, dirigindo empresas, é uma mulher antenada, conectada, moderna. Essa mulher ressurgiu das cinzas, cheia de potência, mas ainda invisível aos olhos da sociedade. E falando sobre menopausa também combatemos o etarismo. Falo sobre a minha menopausa e o meu processo no final da peça, abertamente. As mulheres, homens e jovens da plateia também são convidados a falar. E esse momento é uma catarse, porque toda a família é impactada pela menopausa, as pessoas têm dado depoimentos emocionantes, surpreendentes, todo mundo quer espaço para falar e compartilhar suas experiências.
BP — Como você espera que a peça ajude as mulheres que am por esse momento?
Claudia Raia — A recepção ao espetáculo tem sido inacreditável. Nunca imaginei que fosse tocar tanto as pessoas, que através da arte a gente construísse um serviço público. A peça tem muita verdade, muita informação, mas tudo é tratado com muito humor, porque dessa forma é mais fácil digerir o assunto. E, neste final, que falei, que abrimos espaço para o diálogo com o público, é onde acontece essa troca mágica, de identificação profunda. É justamente nesse momento, em que vamos falar de um assunto tão delicado como a menopausa, que a gente precisa prestar atenção umas nas outras, trocar experiências. Nós queremos ouvir e a plateia precisa falar. É um espaço de cura, de pertencimento. Temos ouvido nos depoimentos mulheres que descobriram ali que estavam na menopausa, homens que falaram que não sabiam que essa fase era tão difícil, filhos que achavam que as mães estavam com demência e se dão conta ali que são as névoas mentais desta fase. Como temos este espaço, já sentimos esse retorno muito direto. Fizemos isso em todas as apresentações em Portugal, tivemos mais de 80 mil espectadores em dois meses e meio, a peça toca as pessoas, é uma comoção.
BP — Na sua vivência na vida real e na peça, qual é a maior verdade sobre a menopausa e qual é a maior mentira sobre ela?
Claudia Raia — A maior verdade é que a menopausa é uma fase obscura, com muitas oscilações hormonais, sintomas físicos cruéis, grandes desafios, muita solidão e, muitas vezes, falta de sensibilidade das pessoas mais próximas. A medicina também costuma minimizar a menopausa, mas ela provoca mudanças absurdas na saúde física e mental das mulheres. E faltam investimentos em pesquisas nessa área, falta esclarecimento. Com o tempo, fui entendendo muita coisa, pesquisando sobre o assunto e vivendo experiências únicas. Tive uma gravidez já sentindo os sintomas da menopausa, algo inédito. Nem os médicos sabiam o que esperar. Essa foi a primeira grande quebra de protocolo na menopausa, para mim. A segunda quebra diz respeito à reposição hormonal. Criamos um mito sobre a reposição e o câncer que já não se sustenta. Sou completamente a favor da reposição, que hoje é muito segura, com acompanhamento médico, claro. Cada corpo é único. A reposição precisa ser personalizada, com um médico que entenda do assunto. O estrogênio vai embora, e o impacto é brutal. Para mim, a reposição hormonal foi uma salvação. Outro mito é que a mulher na menopausa se aproxima da finitude, que não presta mais e pode ser descartada. Mas a menopausa não é o fim. É o começo de um novo ato. E o segundo ato é sempre o melhor. No segundo, as histórias se resolvem. Ainda tem muita coisa para acontecer.
BP — E o que a plateia pode esperar dessa peça?
Claudia Raia — Pode esperar identificação, riso, emoção e muita verdade. “Cenas da Menopausa” não é só uma comédia, é uma conversa íntima sobre um tema urgente. O público vai rir, vai se emocionar, vai refletir, vai se identificar. E, acima de tudo, vai sair com vontade de falar mais, de se ouvir mais, de acolher mais. É um espetáculo feito com o coração — e com muito afeto para todas as mulheres que vivem (ou vão viver) essa fase tão transformadora da vida. Então venham assistir este espetáculo, tragam seus maridos, seus filhos, porque todos têm que estar juntos nesta transição. Queremos que todos saibam que é possível viver com plenitude essa fase. É preciso estender a mão. A menopausa não pode ser uma travessia solitária.
Serviço
‘Cenas da Menopausa’
Onde: Guairão (rua XV de Novembro, 971)
Quando: Sexta-feira (6), às 21h; sábado (7), às 21h; domingo (8), às 18h.
Quanto: De R$ 25 (meia-entrada) a R$ 250, dependendo com o setor. Ingressos à venda no site diskingressos.